Olá, boa tarde! Curioso notarmos como certas marcas do passado provocaram traumas tão profundos na sociedade brasileira que, por vezes, eclodem nos momento menos esperados. Falo não de uma, mas das muitas marcações autoritárias em que o país testemunhou com dor a perda da liberdade, da possibilidade de participar e contestar, expressando opiniões contrárias ao que era tido como “certo”. Foi assim no Estado Novo em 1937 e no Regime Militar instalado a partir de 64, apenas para lembrar acontecimentos que se encontram no cume da história. Porém ela, a história, acredito que sirva precisamente a esse propósito: impedir que os traumas do passado esmoreçam no intento de evitar que o pior se repita, seja como tragédia, seja como farsa. Digo isso porque um período eleitoral é sempre a síntese de um tempo, ora curto, ora longo, mas que pode, sem dúvida, ser pensado como um bom momento de inflexão do passado, do presente e do futuro. As eleições que se aproximam colocam, novamente, a chance de pensarmos o país numa chave maior, onde os atores e os fatos são amarrados pela política na construção do que somos e seremos. O Brasil mudou, num tempo longo, para melhor. Consolidação de direitos, expansão de liberdades, expressão de diferenças, manutenção de instituições, no limite, o século que passou nos mostrou uma viagem capaz de irromper com previsões pessimistas feitas outrora, ainda que haja, sempre, muito por fazer. Contudo, hoje temos, sem medo de errar, uma democracia em muito melhor do que ontem e isso não pode, certamente, ser creditado apenas ao último governo. Ainda assim é usual ouvirmos que os traumas do passado podem repentinamente corroer as conquistas do tempo. Usual e bom. Como disse antes, talvez seja essa a virtuosa tarefa da história. Concorrente a ela, no entanto, incluo a tarefa dos atores do presente, incluo a nossa tarefa. No momento eleitoral que se aproxima enfrentaremos um gargalo onde as conquistas do passado, bem representadas pela transformação da sociedade brasileira que salta aos nossos olhos, serão objeto de disputa dos protagonistas. Dilma, Marina e Serra anseiam, mais do que a negação uns dos outros, ser a síntese do lado bom da nossa história. Mas a viagem, é bom lembrar, não é “redonda” e sim rumo ao futuro. Nela surgem novos temas, como a questão ambiental, por exemplo, e o mais importante é nos assegurarmos que seu percurso seja inquieto, mas pacífico. O presidente Lula é um mito, é o “filho do Brasil”, quanto a isso não vejo problema. A política talvez precise de líderes carismáticos como Lula. Isso não significa, entretanto, que o carisma possa suprimir as regras. A troca pacífica do poder por meio das eleições é o que a história nos mostra como o caminho “certo”. Não creio que o “filho do Brasil” seja contra isso e aqui se encontra a nossa tarefa: garantir que as eleições de 2010 reforcem o regime de segurança mútua que há pelos menos 16 anos vigora entre nós, onde quem é democraticamente derrotado, entrega o poder ao vencedor e aceita o consenso.
4 comentários:
boa tarde diogo! só pegando um gancho da sua matéria, eu e uma dupla estávamos produzindo uma matéria pro jornal da ufjf sobre a repercussão da nova lei orgânica na cidade (sou estudante de comunicação e inclusive fui sua aluna). nossa intenção era pegar algum artigo da nova lei e fazer uma pesquisa para saber o que as pessoas achavam. qdo fomos a campo, qual não foi nossa surpresa quando ao converśarmos com cerca de vinte pessoas, de diferentes classes e idades, inclusive empresários e universitários, ninguém, simplismente ninguem sabia o que era lei orgânica. mudamos o foco da nossa matéria justamente para isso: o desconhecimento da população sobre a lei que rege o município. gostaria de saber a sua opinião: a lei orgânica é falta de conhecimento das pessoas ou descrença total da politica?
Acredito que o desconhecimento da Lei Orgânica não esteja necessariamente relacionado com o fenômeno maior da descrença na política. É uma questão de eficácia: em quais aspectos a Lei Orgânica do município difere substancialmente da Constituição Federal, a ponto de cobrar da população da cidade seu conhecimento? Todos sabemos da sua importância, mas o modo como ela é traduzida para o cotidiano das pessoas não convida ao seu conhecimento.
Essa coluna foi publicada hoje (02/06), com ligeiras alterações, na seção opinião do jornal Tribuna de Minas.
Olá, Diogo. Deliciosa a leitura de teu texto. Só para provocar... Também gosto desta visão romântica da democracia, mas ainda me pergunto o que realmente aprendemos com as experiências do século passado, em 37 e 64, ou mesmo em 88-89. O que significa ir às urnas em "plena democracia"? Escolhar uma oligarquia e perpetuar uma lógica invisível, com cara de candidato elegível? Talvez seja um exagero de minha parte. Entretanto penso que ainda lidamos com muitos desconhecimentos, e, pegando uma carona com tua leitora e tua resposta, se o da Lei Orgânica não está relacionado com a descrença política, deve ter alguma relação com "a má vontade política" pelo conhecimento. Abração. Marcelo Oliveira (UFV)
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