quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

O PT faz trinta anos (Coluna Cena Política - Rádio Catedral FM 102,3)

Olá, boa tarde! O congresso do Partido dos Trabalhadores deste ano teve uma comemoração especial: os 30 anos do partido. Cercado de polêmica acerca da candidatura de Dilma Rousseff à presidência, as tendências que hoje integram a legenda se dividem entre a importância histórica do PT no processo de democratização do Brasil e o pragmatismo necessário ao exercício do governo, conforme defesa de José Eduardo Dutra, presidente recém-empossado. Certamente, dos anos 1980 para cá muita coisa mudou: o muro caiu, o país testemunhou a primeira eleição direta depois de duas décadas, assistiu o impedimento do presidente eleito, consolidou suas instituições com a Carta Constitucional de 1988, elegeu um intelectual paulista para presidente e até, como prova da solidez da democracia entre nós, foi capaz de alçar ao cargo máximo do executivo um operário de origem pobre. Esse, talvez, o marco maior da mudança, não só no PT, mas no cenário político nacional como um todo. Uma rápida recordação dos episódios que sucederam a chegada de Lula à presidência nos mostra como o partido sofreu para governar – com efetivos sucessos, diga-se de passagem – sendo, por vezes, obrigado a cortar na própria carne. Ainda assim, o escândalo do “mensalão”, que custou a saída de José Dirceu, militante histórico, bem como a formação de outras legendas e a desfiliação de quadros antigos – Marina Silva (PV) é a perda mais sentida nos últimos meses –, não foi capaz de abalar o prestígio do presidente e sua capacidade de comandar a sigla em mais uma disputa. O recente congresso, que lançou Dilma e as diretrizes no ano eleitoral que não terá Lula como candidato, cobra um olhar especial. Emitir juízos sobre a história recente é tarefa demasiado complicada, ainda mais se os atores em questão são concretos, como é o caso de Lula e do PT. Ainda assim, me permito dizer uma coisa: a despeito dos fatos, há uma verdade acerca do partido e de seu principal nome que não pode ser desrespeitada e que resultou na democracia em que hoje vivemos. Com isso não digo que o PT deva ser eternizado no poder, nem ao menos que Lula seja uma figura impoluta. Digo apenas que o ano 2010 não verá somente uma eleição disputada pelos dois principais atores do quadro partidário nacional, mas também a celebração do que chamamos, com ou sem propriedade, de democracia: o surgimento de uma imprensa livre, a manifestação de uma oposição, o protesto da sociedade, um partido de esquerda fez trinta anos. Que a história nos ensine também coisas boas. Boa tarde a todos e até o Cena Política da semana que vem!
A coluna Cena Política vai ao ar todas as quintas (por volta das 14:30h) na Rádio Catedral FM 102,3.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Uma ausência percebida na Sapucaí (Coluna Cena Política - Rádio Catedral FM 102,3)

Olá, boa tarde! Na quarta-feira de cinzas deste ano não vimos apenas a surpreendente vitória do Botafogo sobre o Flamengo, nem a tão esperada conquista do carnavalesco Paulo Barros, pela Unidos da Tijuca, depois de tantos anos inovando. Felicidade ou não, outra comemoração se justificou por uma ausência na Marquês de Sapucaí: a do governador José Roberto Arruda (DEM), que viu, presume-se, a homenagem da Beija Flor de Nilópolis a Brasília da cela onde cumpre prisão preventiva desde o final da semana passada. Homenagem esta, aliás, financiada pelo governo do Distrito Federal e que contaria, até então, com a presença de Arruda no desfile, sem qualquer menção à política e é bom que isso fique claro. Mas como o destino é farto em nos pregar peças, a “comemorada” prisão do governador não passou despercebida nem nos desfiles, sendo matéria de todos os jornais nos últimos dias. Não é pra menos. Venho comentando a singularidade dos acontecimentos no DF desde o aparecimento do então apelidado “mensalão do Democratas”, triste com a constatação da mais um caso de corrupção na política brasileira, mas satisfeito com o que o episódio nos mostrou de evolução: a atuação de uma imprensa livre para desmontar esquemas que antes habitavam o desconhecimento; uma sociedade civil pujante que não se aquietou diante das tentativas habituais de tratamento do caso como rotineiro; uma justiça disposta a dar respostas ao que até então era silenciado. Resultado: Arruda está preso! O diagnóstico dos analistas é consensual em afirmar que ele fez exatamente o que não poderia ser feito ao tentar atrapalhar o andamento das investigações. Caso se mantivesse passivo tal como o seu antecessor e “padrinho” político, Joaquim Roriz (PSC), nome corrente em escândalos e que agora volta, pena, a ser cogitado como candidato ao governo do DF mesmo tendo renunciado ao mandato de senador para evitar cassação, teria passado ileso ao que ele vem chamando de “perseguição”. Talvez. Isso porque, tal como venho comentando nesta coluna, o episódio recente assinalou conquistas e longe de tratar o tema da corrupção de forma moralista, foi bom que Arruda tenha sido e esteja preso. De alguma forma, a prisão do governador reforça a tão abalada confia do povo em suas instituições, reata, num certo sentido, seu afeto com a política. Arruda ainda não foi condenado, terá chance de se defender, o que não envolve coagir testemunhas. Ainda assim, o carnaval nos trouxe, como quase sempre faz, um alento. Não paremos por aí. Boa tarde a todos e até o Cena Política da semana que vem!
A coluna Cena Política vai ao ar todas as quintas (por volta das 14:30h) na Rádio Catedral FM 102,3.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Quando FHC fala dos outros falando dele (Coluna Cena Política - Rádio Catedral FM 102,3)

Olá, boa tarde! A semana que antecede o carnaval começou, no domingo, marcada não apenas pelas festividades costumeiras, mas também por uma nova intervenção pública do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) nos jornais de grande circulação do país. Trata-se do artigo de sua autoria, intitulado “Sem medo do passado”, onde ele faz o que até agora parecia que ninguém teria coragem de fazer: defender seus oito anos de governo. Não que eu considere tal defesa totalmente impossível. Mas diante da popularidade do presidente Lula, alimentada pelo inequívoco sucesso do seu governo em diversos setores, contexto que permite com que Lula repita, sem medo, “nunca antes na história deste país” mesmo quando o assunto é o combate à corrupção de seus próprios correligionários, defender o período tucano que antecedeu a chegada do Partido dos Trabalhadores ao poder tornou-se tarefa inglória. Ao que parece, não para Fernando Henrique. Quando li o artigo minha maior expectativa era com relação aos seus desdobramentos, especialmente no modo como o próprio autor se comportaria diante da reação do governo. Isso porque, da última vez que FHC opinou neste cenário que pode, sem medo, ser classificado como eleitoral, com o artigo “Para onde vamos?” publicado em novembro e comentado nesta coluna, ele se defendeu dizendo ser um intelectual isento e livre para manifestações sobre a conjuntura nacional. Não é bem assim e acho que no recente posicionamento do ex-presidente podemos enxergar uma virtude até então ausente: a coragem. De fato, até o presente ninguém havia abertamente aceitado a “armadilha” que o presidente Lula e os articuladores da campanha de Dilma Rousseff à presidência supostamente preparavam, resumindo as eleições de 2010 a um plebiscito do atual governo, o que para a maioria dos especialistas significaria uma derrota acachapante do PSDB no pleito. Pelo visto o silêncio tucano incomodou o ex-presidente, enquadrado pela crítica como o protagonista da “era neoliberal”, que prescindindo de qualquer autorização fez o óbvio: se defendeu. Ainda que os caciques tucanos não assumam, a postura tomada por FHC pode ter agradado ao presidente Lula que vem forçando tal comparação, até então num monólogo. Se Dilma colherá os frutos só saberemos em outubro. Mas uma coisa é certa: Lula encontrou um interlocutor e nós ganhamos com isso, concordando ou não com as partes em disputa. É bom que o debate eleitoral se qualifique e ao assumir a postura de ator Fernando Henrique deixa, sem medo, claro quem ele é. Boa tarde a todos e até o Cena Política da semana que vem!
A coluna Cena Política vai ao ar todas as quintas (por volta das 14:30h) na Rádio Catedral FM 102,3.
Para ler o artigo "Sem medo do passado", de Fernando Henrique Cardoso (puclicado no jornal O Globo em 07 de fevereiro de 2010), clique aqui;
Para ler o artigo "Para onde vamos?", de Fernando Henrique Cardoso (publicado no jornal O Globo em 01 de novembro de 2009), clique aqui;
Para ler a coluna Cena Política "As regras estão estabelecidas, mas o jogo ainda será jogado", que comenta o artigo e a reação de Fernando Henrique (publicada neste blog em 12 de novembro de 2009 e no jornal Tribuna de Minas - JF em 13 de novembro de 2009), clique aqui.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

A política e o seu lugar (Coluna Cena Política - Rádio Catedral FM 102,3)

Olá, boa tarde! A novela que acompanha a discussão do projeto “ficha limpa”, que torna inelegíveis pessoas que respondem a processos na Justiça, está cada vez mais distante do fim. O que é bom e ruim. Digo isso, porque se a corrupção é um mal que devemos combater, eu particularmente não considero o projeto em questão a melhor alternativa para alcançarmos uma vida republicana saudável. Sei que essa é uma posição perigosa, até porque os defensores do projeto atendem aos apelos da opinião pública em seus anseios mais moralistas, encontrando os culpados pelo mal, e ao mesmo tempo quem irá nos redimir. Por um lado, os meios de comunicação bombardeiam a sociedade com periódicos escândalos de corrupção, sempre recheados com alta qualidade de som e imagem, mostrando como os responsáveis pelo problema, quase sempre homens da política e empresários inescrupulosos, não se movem para resolvê-lo, contando, ainda, com a conivência de “colegas” que preferem fazer “vista grossa”. O recente caso da eleição do presidente da Câmara do DF serve bem de exemplo: por meio de um consenso não se sabe com base em quê, um partidário de Arruda foi alçado ao posto para evitar que o governador sofra danos maiores; por outro lado, novos atores da vida democrática, falo especialmente dos operadores do direito e suas entidades representativas – como a Associação dos Magistrados Brasileiros, o Ministério Público e seu movimento de democratização –, apresentam-se para a sociedade como figuras idôneas, livres de qualquer imperfeição cotidiana, presentes, vale ressaltar, na política. Na mesma semana em que a Câmara Federal não conseguiu dar andamento ao projeto “ficha limpa”, Gilmar Mendes, presidente do STF, compareceu a cerimônia de abertura dos trabalhos legislativos e reafirmou que a Justiça no país é, digamos, quase “divina”, ainda que conviva com uma lentidão “pontual”. É fácil enxergarmos o saldo final: políticos não prestam e deveriam, como os homens da Justiça sugerem, ir para a cadeia. O problema é que essa não é uma matemática simples. A Justiça também tem os seus problemas e o excesso de demanda criado em cima da sua crescente visibilidade não pode ser ignorado. A cada dia aumenta o número de processos sobre temas polêmicos e seguramente decisões administrativas não são o melhor caminho para incrementarmos os valores democráticos. A política é o caminho! Mas por que a sociedade pensa exatamente o contrário? Acredito que o motivo é bem representado pela discussão em torno da “ficha limpa”: ao invés de propor mudanças substantivas para controlar a corrupção desde o processo eleitoral, como a discussão do financiamento de campanha para impedir a entrada irrestrita de dinheiro e empresários nas eleições, os parlamentares preferem revolver assuntos inócuos, declinando do seu papel republicano. Sobra para o Judiciário. Ou a política assume o seu lugar, ou a sociedade continuará achando que ela não serve para nada. Boa tarde a todos e até o Cena Política da semana que vem!
A coluna Cena Política vai ao ar todas as quintas (por volta das 14:30h) na Rádio Catedral FM 102,3.