sexta-feira, 9 de março de 2012

O Brasil, a FIFA e o "complexo de vira-lata" (Coluna Cena Política - Rádio Catedral FM 102,3)

O embate gerado pelas polêmicas declarações do secretário geral da FIFA, o francês Jérome Valcke, dizem muito sobre o modo como o Brasil se entende hoje e, sobretudo, quer ser entendido no mundo. Episódio que serve, ainda, para pensarmos nos ganhos que eventos de grande porte, como a Copa do Mundo e as Olimpíadas, promovem nos países onde ocorrem. Lembremos os fatos. Diante do atraso na votação da chamada lei da geral Copa, medida extraordinária que regulamentará os jogos no país, pois já temos um Estatuto do Torcedor que será deixado momentaneamente de lado, o secretário da FIFA disse que o país precisava “levar um chute no traseiro”. Aldo Rebelo, ministro dos esportes, imediatamente reagiu, dizendo não ser mais Jérome Valcke um interlocutor, colocando como condição para a continuidade dos trabalhos a substituição, por parte da FIFA, do seu representante no Brasil. A entidade, por sua vez, teria contratualmente o direito de retirar a copa do Brasil até o meio do ano, transferindo o evento para outro país mais “dócil”. Logo, alguns, ainda abalados por aquilo que Nelson Rodrigues chamava de “complexo de vira-lata”, criticaram Aldo Rebelo, talvez por seu “orgulho” exagerado. Assim como numa briga entre amigos, a turma do “deixa disso” não tardou em aparecer, com pedidos de desculpas que aguardavam, até agora, apenas o aceite do próprio ministro. Não é de hoje que sabemos que eventos como a copa trazem inúmeros benefícios para os países onde ocorrem, como o incremento dos meios de transporte, a melhoria dos estádios, grandes lucros com o turismo, além da própria visibilidade do país e do incentivo ao esporte. A dúvida que persiste, no entanto, é sobre a durabilidade desses benefícios. Não precisamos ir longe. A copa da África do Sul, ocorrida em 2010, primeira realizada naquele continente, transformou o país nos dias que circundaram o evento, com melhoras inclusive no sistema judicial. Apesar disso, dois anos após o término da competição discute-se a demolição de alguns dos milionários estádios erguidos, antes sua inutilidade num país que tem pouco apreço pelo futebol. Nosso caso é, por certo, diferente. Aqui o futebol é paixão nacional. Mas o exemplo, a meu ver, é o mesmo: a FIFA parece uma “nave espacial” que pousa no país, promove suas transformações e, depois, vai embora. Os desdobramentos do que fez pouco importam. No fato recente, o soberano Congresso Nacional discute uma lei que afetará a realização do evento no nosso território e a entidade quer “dar as cartas” também nisso. Certamente Câmara e Senado têm os seus defeitos e barganhas pautadas por interesses nada nobres podem motivar atrasos e retrocessos. Ainda assim, perdoe-me o Sr. Jérome Valcke, mas Aldo Rebelo está certo e não somos “vira-latas” para tomar um “chute no traseiro”. Aqui quem dá as cartas somos nós!

A coluna Cena Política vai ao ar todas as sextas (no jornal das 8h), na Rádio Catedral FM 102,3.