Olá, boa tarde! Ontem a Câmara dos Deputados decidiu, para a surpresa de poucos, adiar a votação do projeto de lei que torna inelegíveis candidatos condenados em primeira instância, desde que a decisão tenha sido tomada por um colegiado de juízes. Na prática, o projeto, fruto de uma iniciativa popular que já conta com mais de 1 milhão e meio de assinaturas, voltará para a Comissão de Constituição e Justiça para ser analisado e, só então, seguirá para votação o que pode inviabilizar sua implementação ainda este ano. Ao que tudo indica a proposta não valerá para as próximas eleições. Confesso não ser um entusiasta da chamada “ficha limpa”, muito mais pela ineficácia da proposta do que por sua intenção. Mesmo assim, a decisão de ontem ensejou declarações problemáticas e positivas, dos personagens menos esperados, que merecem alguns comentários. A bancada governista se opõe ao projeto pelo argumento mais óbvio, mas não menos relevante, que denuncia o ambiente político presente em alguns tribunais regionais, o que faria com que disputas eleitorais fossem impedidas por meio de decisões judiciais partidarizadas. Lembro os ouvintes que na história deste país a nomeação de juízes e delegados de policia já foi ponto de disputa política em diversas localidades, prerrogativa reivindicada pelos chefes políticos locais junto aos caciques estaduais e nacionais com o objetivo de manter sob seu controle cidades inteiras. Páginas nada honrosas da nossa história que chegaram aos nossos ouvidos por meios de expressões como coronelismo, voto de cabresto, dentre outras. Mas foi a declaração do deputado João Pizzolatti, para a surpresa de muitos do PP de SC, que mais me chamou a atenção. Alertando para a impotência do congresso ele disse: "Ou vamos fazer política, ou vamos fazer um projeto legal". Achei curioso, pois esse é precisamente o meu incômodo em relação ao projeto, ainda que eu tenha muitas reservas quanto ao deputado mencionado. Todos estão de acordo quando o assunto é combater a corrupção. Mais do que isso, o aparato punitivo tem respondido positivamente nos processos de cassação por compra de votos, por exemplo, ainda que tenhamos muito que melhorar. Preocupa-me, apenas, imaginar que o Congresso mais uma vez se esquiva de debates cruciais para o controle da corrupção, como financiamento de campanhas, e se prende em saídas midiáticas e, por que não, moralistas. Nenhuma reforma política será perfeita e mesmo a “ficha limpa” ainda dependerá de uma justiça honesta e eficaz. Por isso, é preciso que o eleitor se conscientize da importância do seu voto e puna candidatos ruins nas urnas. Também sou contra a corrupção, mas receio que a política nas mãos de juízes não seja necessariamente o melhor caminho. Boa tarde a todos e até o Cena Política da semana que vem!
A coluna Cena Política vai ao ar todas as quitas (por volta das 14:30h), na Rádio Catedral FM 102,3.
3 comentários:
Toda vez que me disponho a tomar aulas na faculdade de Direito me pego pensado no que acabei de ler: política nas mãos de juízes não é o melhor caminho. Enfim, isso é extremamente pessoal, desde que se tenha algum conhecimento de causa e se estabeleça um contexto adequado. No mais, penso que seria improprio pedir que alguém que exergue bem arranque seus proprios olhos. Sendo menos sutil, é de se esperar que ladroes cortem suas proprias maos pra nao roubar mais? A gente vai levando, já dizia o poeta...
Não sei ao certo qual o melhor caminho, ao mesmo tempo em que acredito que o direito exerceu um papel civilizatório importante na história do país. Mas desconfio de soluções que prescindam da política: se o projeto "ficha limpa" pretende constituir um "filtro", quem controlará o controlador? Sem falar, é claro, que o princípio da representação que vigora entre nós não é este, diferentemente do que podemos observar nos EUA, por exemplo. Aqui a representação pretende ser, ainda que não consiga, um "espelho" da sociedade. Grato pela leitura e comentários.
Essa coluna foi publicada na seção opinião do jornal Tribuna de Minas, Juiz de Fora-MG, em 13/04/2010.
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