Olá, boa tarde! É comum ouvirmos que “sempre é tempo de recomeçar”. A idéia de que podemos tomar novas decisões e mudar radicalmente os rumos da nossa vida é aparentemente incontestável. Não creio, porém, que em matéria de política as coisas sejam bem assim. A divulgação, no início desta semana, dos novos dados da corrida eleitoral do próximo ano atesta a impossibilidade de tomarmos decisões a qualquer momento acreditando que as chances de escolhas serão as mesmas, como se o tempo pudesse ser congelado. O dado é a pesquisa CNT/Sensus de intenção de voto para as eleições de 2010 que aponta, em linhas gerais, o crescimento da candidatura governista, indicando 21,7% das intenções para Dilma Rousseff (PT), no cenário mais provável montado pela pesquisa. E “provável” justamente porque a grande interrogação é, também, agravada com os novos dados: o principal partido de oposição ao governo no próximo pleito, o PSDB, ainda não tem candidato definido e vê, com certa dose de desconforto, o crescimento das intenções de voto no governador de Minas, Aécio Neves. Ainda que José Serra lidere nas intenções auferidas, Aécio surge incomodamente, emparedando seu partido e seu opositor interno com a ameaça de não aguardar até março, como deseja Serra, a definição da candidatura tucana. Certa vertente da ciência política contemporânea, poeticamente intitulada “Escolha Racional”, acredita que os homens são racionais. Crença compartilhada por muitos, a despeito das evidências. Mesmo assim, parece residir aí uma boa pista para compreendermos o presente. Isso porque, ao entender as decisões como racionais, esses estudiosos da política descrevem o comportamento humano como uma “máquina de calcular”: com base nas informações disponíveis sobre as alternativas em questão, optam pela que melhor satisfaz a sua relação de custo/benefício. É como num jogo de xadrez: um jogador move uma peça de modo que quando o outro for mover a sua terá que levar em consideração as alternativas criadas pelo adversário, não podendo mais tomar qualquer decisão sob pena de perder. Ao protelar a sua decisão, o PSDB de Serra assiste o crescimento dos adversários que se movem no tabuleiro negligenciando o impasse tucano. Com isso, as escolhas se estreitam, as alternativas diminuem, os jogadores têm chances cada vez menores de “recomeçar”. O jogo já começou e Aécio parece ter entendido isso antes todo mundo. Boa tarde a todos e até o Cena Política da semana que vem!
A coluna Cena Política vai ao ar todas as quintas (por volta das 14:30h) na Rádio Catedral FM 102,3.
Olá, boa tarde! No último domingo, dia 15 de novembro, a República Federativa do Brasil comemorou os seus 120 anos. Curioso notarmos que salvo pequenas manifestações, a data passou sem alarde: o país viveu mais um domingo qualquer. Há algo de aparentemente perturbador nisso: por que os ideais republicanos não têm entre nós, bem como as demais comemorações cívicas, maior apreço? Buscar explicações nos fatos históricos talvez ajude, ou talvez torne ainda mais turva a nossa compreensão sobre o nome do país. Isso porque, é “incômodo” recordar o conhecido comentário de Aristides Lobo – cronista à época do Império, abolicionista e com fortes tendências “republicanas” – sobre o modo como o povo recebeu “bestializado” as tropas que “proclamaram” a República em 1889, sem saber o que estava acontecendo. Ignara também permaneceu a sociedade carioca quando Getúlio Vargas iniciou a construção da avenida que hoje leva o seu nome na década de 1940, deslocando o monumento em homenagem à proclamação para dentro da Praça da Republica, como se pudéssemos a todo o momento remover do lugar os ideais e seus símbolos. Ontem, como hoje, estimamos nosso sobrenome, Brasil, mas em nada nos ofendemos quando desrespeitam o nosso primeiro nome, República. Mesmo que o nome não diga o que somos, ele importa! E mais do que isso, a República no Brasil foi uma conquista no caminho da democracia que não pode ser esquecida. Seguramente, temos muitas lutas pela frente até que a sociedade alcance o patamar de justiça e igualdade que tanto sonhamos. Lutas que não podem, como no passado, prescindir da participação do povo. Recentemente a profa. Emília Viotti da Costa nos lembrou que “a história não caminha em linha reta para um futuro melhor”. Daí a necessidade de não esquecermos o passado, única chance de termos um futuro. Boa tarde a todos e até o Cena Política da semana que vem!
A coluna Cena Política vai ao ar todas as quintas (por volta das 14:30h) na Rádio Catedral FM 102,3.
Para ler a excelente entrevista com a professora e historiadora Emília Viotti da Costa, publicada no portal Conexão Professor, do governo do Rio de Janeiro, clique aqui.
Olá, boa tarde! Nas últimas semanas articulistas, intelectuais e políticos demonstraram certo desassossego com a publicação do artigo “Para onde vamos?”, de autoria do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). No texto, o autor critica o governo Lula, sugerindo que o personalismo com o qual o presidente trata a política seria responsável por “pequenos assassinatos” da democracia, ao ignorar desvios de conduta e arranhões na lei responsáveis, no limite, por um “subperonismo (o lulismo)”. Acusação que foi energicamente rebatida pela ministra Dilma Rousseff (PT) e demais partidários do presidente, implantando aparente desconforto na imprensa. O curioso é notarmos que grande parte da sociedade permaneceu à margem desse debate, como se entre a “opinião pública” e a “opinião publicada” – tema caro àqueles que pensam a comunicação nos dias de hoje –, houvesse um hiato insuperável. O fato, é que na última segunda-feira (09/11/2009), numa homenagem realizada pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP) ao vice-presidente José Alencar, Lula forjou mais uma declaração para apimentar o debate sobre sua suposta propensão “autoritária”. Ao se dirigir elogiosamente a Alencar, ele disse: “nós dois até que agüentaríamos mais cinco anos de batalha, mas somos democráticos, estamos quietos e vamos esperar o jogo ser jogado”. Pessoalmente ouvi de bom grado mais um dístico popular pronunciado pelo presidente, dentre os muitos que ouvimos nos últimos 7 anos de governo. Entretanto, setores da “opinião publicada” rebelaram-se, ressaltando o “perigo” das declarações, que segundo alguns manifestariam uma vontade íntima de rever as regras do jogo às vésperas da decisão. Dentre as críticas, uma me chamou particular atenção ao afirmar que “qualquer cidadão comprometido com as normas democráticas sabe que não há nada o que esperar, [pois] o jogo já está jogado e as regras já estão estabelecidas”. Posso estar enganado, mas antes de qualquer jogo ser jogado devemos, de maneira inequívoca, estabelecer suas “regras” no fito de evitar que casuístas revejam as normas a seu favor. Lula pode até ter revelado, em tempos recentes, um pendor “autoritário”, como atores engajados têm apontado. Pode, mas não por isso. O presidente é mais um ator e também pontua sua opinião dentre as muitas que circulam, sem necessariamente alinhavar no horizonte um “golpe” a toda hora. Lula, como FHC, também está jogando, pode ganhar e pode perder. E no caso das eleições de 2010, as regras já estão estabelecidas, mas o jogo ainda não foi jogado. Boa tarde a todos e até o Cena Política da semana que vem!
A coluna Cena Política vai ao ar todas as quintas (por volta das 14:30h) na Rádio Catedral FM 102,3.
Para ler o artigo "Para onde vamos?", de Fernando Henrique Cardoso (publicado no jornal O Globo, dia 01 de novembro de 2009), clique aqui.
Para ler o artigo da "opinião publicada" que motivou a coluna desta semana, intitulado "Jogo jogado", de autoria de Merval Pereira (publicado no jornal O Globo, dia 11 de novembro de 2009), clique aqui.
Na semana passada mais um caso de violência irrompeu os noticiários nacionais. Como tem se tornado costume, o episódio reverberou nos sítios de compartilhamento de vídeos, como o Youtube, recuperando, inclusive, acontecimentos similares nos últimos meses. Trata-se do ocorrido no dia 22 de outubro de 2009, quando a estudante Geysi Arruda, aluna do curso de Turismo da Uniban no ABC paulista, foi hostilizada pelos “colegas” universitários por trajar um vestido considerado curto, com base em parâmetros seletivos, certamente. As imagens da aluna sendo ovacionada “puta” por um corredor abarrotado de estudantes, no momento em que era escoltada por policiais para fora, chama a atenção para o modo como a sociedade contemporânea tende a tornar “patológico” exatamente o excesso do que ela mesma prescreve como sendo o “padrão”. Curioso notarmos como determinadas práticas convertem-se em “doença” num passe de mágica: comida saudável, malhação e a utilização de anabolizantes animais; emagrecimento, prótese de silicone e transtornos por repetidas intervenções cirúrgicas; dentre outras. Ainda que o fato evidencie uma variada gama de inflexões sociológicas, como a separação entre a moralidade e a legalidade – o aparato repressivo do Estado foi convocado para frear “malta” ensandecida a partir de julgamentos morais –, me incomoda o modo como a grande mídia teima em retratar fenômenos heurísticos dos rumos perversos de uma sociedade que privilegia o “belo” e enaltece a ausência de mediadores – como o simples diálogo –, em favor da cultura dos meios, seja o dinheiro ou a violência. No domingo à noite, o semanário em progressivo declínio de audiência da Rede Globo de Televisão, Fantástico, noticiou o episódio envolvendo Geysi Arruda lembrando de fato semelhante ocorrido em abril, quando uma aluna do curso de Educação Física decidiu não participar de uma manifestação de estudantes contra o sistema de avaliação da Uniban, sendo também agredida pelos “colegas”. Na matéria que foi ao ar, os dois episódios são tratados como aparentemente “iguais”, no que eu talvez concorde, sem, entretanto, aceitar o modo como a reportagem encerra a análise: Gloria Kalil, consultora de moda do programa, comenta o fato dizendo que “o modo como nos vestimos é um recado que damos ao mundo”, e isso a aluna parece “não ter entendido”. É perturbador imaginar que ambas as agressões tratam-se apenas de um “delito” no plano da moda, como se Gloria Kalil, ao comentar hipoteticamente o outro episódio, dissesse: não é “chique” sair de uma manifestação de estudantes, é “deselegante”. Nada contra a moda ou o respeito a padrões civilizacionais, apenas reivindico que não rebaixemos nosso olhar diante de acontecimento que manifestam a tendência de um mundo triste, cada vez mais incapaz de negociar com a diferença. Mesmo a vítima, em declarações para a imprensa, traduz o perigo quando diz: “eu não sou esse tipo de gente que disseram”. Que tipo? Será que ela quis dizer que é igual aos que a agrediram verbalmente por “confusão”? Acho que algo mais do que se vestir errado deve explicar a incompreensão mútua. Temo pelo barulho e pela surdez.
Para assistir a reportagem do Fantástico comentada no artigo, clique aqui.
Olá, boa tarde! Esta semana mais um episódio de conflito entre os Poderes da República, ou mesmo no interior deles, ocupou os noticiário nacionais. Trata-se da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) pela cassação do senador Expedito Júnior (PSDB-RO), condenado pela compra de votos nas eleições de 2006, que foi postergada pela mesa diretora da casa. José Sarney (PMDB-AP), presidente do Senado Federal, optou por uma consulta a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), presidida pelo senador Demóstenes Torres (DEM-GO), antes de cumprir a decisão. Seguramente, Expedito será cassado, contando com parecer favorável a decisão do STF, como as declarações de Demóstenes indicam, reforçando a ilegitimidade da comissão para rever decisões do Supremo. Entretanto, o modo como os personagens envolvidos na “confusão” se comportaram, por meio de declarações irônicas inclusive, denuncia falhas e excessos. Não entro no mérito da cassação em si, tomando como pressuposto que Expedito deve ter, realmente, motivos para ser cassado. Furto-me, também, de comentar as insólitas declarações de Cristóvam Buarque (PDT-DF) e do próprio Sarney, matéria-prima ótima para páginas de fofoca. Isso porque, o modo como Gilmar Mendes, presidente do STF, reagiu ao encaminhamento do Senado é o que mais me preocupa, não como fato isolado. Ao dizer se negar “a acreditar que o senado está a recusar o cumprimento de uma decisão do Supremo Tribunal Federal”, o que Gilmar Mendes diz, com certa dose de eufemismo, é não acreditar que o seu “poder” possa ser contestado na República. Desde Montesquieu, importante pensador da política no século XVIII, a noção de separação, ou melhor, de mútua influência dos poderes, quando todos têm igual forçar para controlar as ações dos demais, parece ser a melhor fórmula encontrada na democracia para evitarmos “excessos”. Fato é que, em tempos recentes personagens oriundos do Judiciário parecem acreditar que suas funções vão além do estabelecido pela Constituição Federal, contanto, inclusive, com certa passividade e ineficiência do mundo da política. Cabe ao Supremo discutir a constitucionalidade das matérias, não cabe, por exemplo, a Gilmar Mendes emitir opinião sobre a violência urbana no Rio, como o fez. Se os Poderes da República devem se controlar, precisam ter igualdade de força e palavra, como o registro mais remoto da democracia já defendia. Logo, se precisamos, como outro ministro do Supremo sugeriu, “fechar o Brasil para balanço”, os erros e excessos do Judiciário devem também entrar na conta. Boa tarde a todos e até o Cena Política da semana que vem!
A coluna Cena Política vai ao ar todas as quintas (por volta das 14:30h) na Rádio Catedral FM 102,3.
Para assistir a reportagem sobre a polêmica em torno da cassação de Expedito Júnior (PSDB-RO), clique aqui.
Para assistir ao desdobramento do caso, com a desistência do senador Expedito Júnior de encaminhar um recurso na CCJ do Senado contra a decisão do STF, tendo a casa já empossado Acir Marcos Gurgacz (PDT-RO), segundo mais votado na disputa, clique aqui.