quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

O mesmo enredo (Coluna Cena Política - Rádio Catedral FM 102,3)

O começo de um novo governo parece seguir um enredo padrão. Candidatos vitoriosos são empossados, solenidades cívicas reforçam a esperança de muitos, equipes ministeriais e secretarias são nomeadas, cargos são disputados – alguns mais, outros menos – com voracidade pelos inúmeros partidos que compõem o cenário político nacional. Por certo, o destino sempre espreita o ordinário, pronto a incomodá-lo com acontecimentos imprevistos que cobram dos atores respostas para além do enredo suposto. As chuvas deste início de ano poderiam, quem sabe, assumir esse papel de um acontecimento extraordinário. Poderiam, não fosse sua constância e o permanente desafio endêmico que circunda o problema. Ainda assim, não tardam a aparecer críticas oportunistas, identificando no presente imediato a responsabilidade pelos desastres. O desafio, porém, é maior e repousa na inescapável redução das desigualdades sociais e da pobreza e no correto planejamento do uso do espaço pelo homem. Enfrentar, de fato, o problema é uma armadilha curiosa: o corajoso governante que resolver fazê-lo não será, creio, reeleito. Sua resolução cobra medidas impopulares, como remoções e o impedimento de construções em áreas de risco, sem falar, é claro, no planejamento urbano global que em nada se aproxima do desenfreado interesse do capital imobiliário. É possível? Seguramente sim. Então o que, haja vista que a solução de um problema tão grave não deveria ser tão óbvia, nos falta? Talvez o desastre que tristemente assolou, com maior gravidade, a região serrana do estado do Rio constitua um ponto de inflexão para que a sociedade civil compreenda o seu papel. Não é de hoje que a passividade dos atores sociais enseja situações semelhantes: ante a incapacidade ou, na pior das hipóteses, a falta de vontade do poder público de enfrentar problemas que custariam tempo, dinheiro e, sobretudo, votos, a sociedade permanece ordinariamente refém do “imprevisto”. No momento, além da solidariedade e das orações, devemos compreender que daqui em diante o governo não pode mais governar sozinho, sob pena de não tomar as decisões necessárias. A sociedade deve compreender seu papel ativo no enfretamento do problema. Do contrário, assistiremos o mesmo enredo no próximo ano, como a crônica de muitas mortes anunciadas.

Nenhum comentário: